segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Não sei desenhar abraços

Entra nos ossos a humidade e o frio de Mira-Sintra, a cor do dia, por lá, nunca é muito clara, sempre há um sol tapado por uma coberta pintada a nevoeiro.
Mira-Sintra, não tem mais de um mês para mim, lá e em tão curto espaço de tempo, fui abraçada duas vezes. Abraços fortes que roçam como um grito em sufoco angustiante. Sufoco meu? Sufoco deles? Será o meu que em grande anseio chama por eles, por esses abraços espontâneos de adolescentes de hormonas ferventes? 
Hoje foi uma Carolina, abraçou-me no pátio da escola e em plenos pulmões gritou, "professora linda!!!" por momentos aterrorizei, pensei se aquele entusiasmo seria natural, olhei para ela fixamente, com meus olhos assustados, pânico talvez, de tão bom abraço aquele, que a Carolina desenlaçou-se do meu corpo e encolhida como um cachorro a ser castigado por tamanha audácia, sussurrou em tom bem baixo, "desculpe stôra, mas gosto de si", virou as costas e correu para trás do pavilhão.
Foi a última a entrar na sala, de corpo descontrolado e atitudes desvairadas, um comportamento péssimo durante 90 minutos, não se concentrou nem conseguiu pintar 2 mm de folha. Chamei-a e perguntei o que se passava com ela, sorriu e corou ao mesmo tempo, respondeu-me com uma pergunta, "o mesmo que a professora?", olhei-a em silêncio, um olhar fixo mas estremecido, e pelo meu sossego desassossegado ajudou-me retorquindo com menos segurança, "tenho carências stôra, só isso!"


quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Todos Estivemos Feios!


Ninguém pediu mas registo a minha opinião. Uma opinião baseada no que vou lendo nas publicação dos jornais e mesmo nos comentários da rede social facebook sobre a manifestação de ontem, do que vi através dos olhos de operadores de câmara do que ouvi pela boca de outros ilustres e do que senti e vivi de forma não presencial mas emotiva.
Sei que sou uma pura gargantolas, que expresso o quanto me enerva na passividade de um povo de brandos costumes que fez uma “revolução romântica” aos meus dois anos de existência.
Onde eu estava no 25 de Abril? Provavelmente a comer uma papa Pensal feita a leite em pó. Sim, sou uma piegas, ainda que, com ânsias a inovadora morna que a nada me leva. Afinal ficou-me tatuado na pele de menina o quanto seria uma subjetiva contestatária, e esse efeito é bem pior que estar presa, porque nesta prisão os muros erguidos são a transparentes tijolos e de arame macio ornamentados. Certo é que não concordo com violência, alguns sabem, fecho os olhos no cinema a todas as cenas de agressão física e pergunto de dois em dois segundos, a quem me acompanha naquele escuro, se já os posso abrir. Imaginem no real. MEDO, muito medo.
Não quero, ou tento não estar em terra do santo ou em solo do pecador, mas sim no lado da “terra do nunca”, estivemos feios! E continuamos a o ser depois do rescaldo. As escadarias que leva ao edifício que é de todos estava já limpa ao raiar do sol, quem ali passasse nem percebia que existira greve geral entre os que limpam a cidade. Mas as opiniões, essas, nem sempre são limpas de espinhas. São opiniões de garganta, de quem acha ficar bem a agradar alguns ouvidos. Estivemos feios! Somos todos povo, ou será que os policias são do departamento das águias rapinas, os estivadores dos canídeos, os professores das aves noturnas, os desempregados parasitas das águas paradas e por aí a fora? Somos todos povo e povo lesado!
Sim é bonito ver a jovem gira agarrada em abraços meigos aos fardados azuis, é! Funcionou desta forma lírica? Claro que sim, um impacto apaixonante nas redes sociais, olha que coisa má linda! Os nossos olhos brilham, enchemos o peito de orgulho e fica por ali, um registo fotográfico para picar com um pionés num qualquer quadro de cortiça lá do trabalho!(para quem o tem). 
Ontem os paralelos voaram sem asas, se eram mulheres bonitas ou putos feios a dar-lhes credibilidade aeronáutica não sei. Sei que outros objetos ganharam igual elevação e muitas fotos foram sacadas para fazer história em registo fotográfico. Muitas hoje publicadas, algumas de uma beleza sem igual, a mais parecerem pinturas com sfumato renascentista. Funciona desta forma agressiva? Claro que sim, choca os nossos mais exonerados sentidos. Com alma ainda cai uma lágrima ao ver uma cabeça grisalha com mais de 70 primaveras tingida a púrpura, ou a cara assustada de uma criança que estava ali acreditada na força Herculeana do seu progenitor. Todos levaram! Todos Estivemos Feios! FOI FEIO.

domingo, 11 de novembro de 2012

Supões



ri como uma tolinha
enrola essa ervinha,
ri, não estejas zangada,
muito menos enervada
e ri
dizendo coisas parvas
ri,
não quero saber,
nem te mostrar nada,
nada!
ri como um tolinho
e dá mais um bafinho,
esquece lembrando
que só queres ir,
só queres mesmo rir,
ri sem perceber
e depois chora gostando
e gosta gozando,
roda mais uma
bafa outra
e cai, não compares
e não te estragues,
ri, ri.

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Insónia de morango


Quando era miúda não gostava de morangos.
Não há muito tempo, queria eu lá saber do que não gostava! Com convicção, encarava sem dramas o que eu gostava. E era tanta a bagagem do saber bem querer, que pouco restava para alarmar no onde se acondicionar o não se apreciar. Tenho saudades. Mentira! Vivo num sentimento de extravio desse entender. Igual, a quem leva como seguro e despreocupado, num bolso de um agasalho, um qualquer papelinho rabiscado a lembrança, e sem saber como, deu-se-lhe sumisse. E esse arcaico lembrete ficou para lá, caído sem juízo numa calçada qualquer ou numa escadaria da Mouraria da minha vida.
Não gostava de morangos e pronto! Também os havia, aqueles que não gostassem de chocolate e merecessem igual cerrar de sobrolho? Havia.
Como? Como achar ou assumir que tudo é bem mais importante agora do que outrora. E eu só não gostava de morangos...
Angustia-me o dia, abala-me a noite que era por si só tão fácil e protegida.
Aprendemos tanto na infância, estragamos muito mais depois.
Deixem-me só não gostar de morangos doces e amar laranjas ácidas.
Como me proteger e lembrar que amo? E como deixar que um alguém me ame mesmo sabendo que eu um dia só não gostava de morangos?