quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Insónia de morango


Quando era miúda não gostava de morangos.
Não há muito tempo, queria eu lá saber do que não gostava! Com convicção, encarava sem dramas o que eu gostava. E era tanta a bagagem do saber bem querer, que pouco restava para alarmar no onde se acondicionar o não se apreciar. Tenho saudades. Mentira! Vivo num sentimento de extravio desse entender. Igual, a quem leva como seguro e despreocupado, num bolso de um agasalho, um qualquer papelinho rabiscado a lembrança, e sem saber como, deu-se-lhe sumisse. E esse arcaico lembrete ficou para lá, caído sem juízo numa calçada qualquer ou numa escadaria da Mouraria da minha vida.
Não gostava de morangos e pronto! Também os havia, aqueles que não gostassem de chocolate e merecessem igual cerrar de sobrolho? Havia.
Como? Como achar ou assumir que tudo é bem mais importante agora do que outrora. E eu só não gostava de morangos...
Angustia-me o dia, abala-me a noite que era por si só tão fácil e protegida.
Aprendemos tanto na infância, estragamos muito mais depois.
Deixem-me só não gostar de morangos doces e amar laranjas ácidas.
Como me proteger e lembrar que amo? E como deixar que um alguém me ame mesmo sabendo que eu um dia só não gostava de morangos?

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